quinta-feira, 24 de maio de 2018

Alianças da Diversidade – Uma Escola Segura para Tod@s

 
 
Os dados estatísticos não mentem: 48% de jovens gays e lésbicas, bem como 33% de jovens bissexuais já foram alvo de homofobia e bifobia em contexto escolar (Freitas e Fontaine, 2014). Perante um contexto ainda discriminatório e heteronormativo, 94% de jovens lésbias, gay, bissexuais, trans e intersexo (LGBTI) optam por esconder a sua identidade, enquanto 36% a revelam de forma seletiva. E os números não se ficam por aqui: 60% já ouviu comentários ou testemunhou eventos negativos e 44% diz ser muito comum ouvir piadas sobre a sua identidade no dia-a-dia (Inquérito LGBT da Agência Para os Direitos Fundamentais da União Europeia, 2013). Perante este cenário, como podemos contribuir para que a escola seja um lugar seguro? A lei Lei n.º 60/2009 estabelece a obrigatoriedade de lecionar Educação Sexual nas escolas, nas diferentes disciplinas, implementada, por exemplo, através do PES – Projeto de Educação para a Saúde. Não existem, contudo, evidências que a abordagem destes conteúdos seja inclusiva.
 
 
É neste âmbito que surge a ideia das Alianças Da Diversidade (ADD), um novo projeto da Associação ILGA Portugal. Os dados são claros na necessidade de tomar medidas que visem combater todas as formas de discriminação em função da orientação sexual, identidade ou expressão de género ou características sexuais. O principal objetivo é a integração da população jovem LGBTI. Como? Não existe uma fórmula universal; para criar uma Aliança da Diversidade basta que um grupo de pessoas (independentemente da orientação sexual e identidade e expressão de género!) forme um grupo com o objetivo de dar visibilidade positiva a identidades não normativas, e a partir daí muitas ideias e atividades são válidas e bem-vindas, especialmente se partirem da própria comunidade escolar. Já assistimos a iniciativas como: encenações de situações românticas entre casais do mesmo sexo; o hastear da bandeira arco-íris; uma photo booth de aliad@s; a comemoração de datas simbólicas para a comunidade LGBTI (como por exemplo, o IDAHOT, no dia 17 de Maio - Dia Internacional da Luta Contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia), entre muitas outras.
Ideias não faltam, aliados e aliadas também não: porque continuam então a soar tão alto as vozes da discriminação? Acreditamos que as Alianças da Diversidade são um importante contributo para esta necessidade de resposta: todos/as os que se identificam com a causa e acreditem na importância da luta pelos direitos humanos, sejam estudantes, docentes ou qualquer outro membro da comunidade escolar, podem ter a iniciativa de iniciar uma Aliança. Uma comunidade escolar que promove a diferença e trata todos/as como iguais é o ideal de escola segura e inclusiva!
 
 
Para mais informações:
add.ilga-portugal.pt | add@ilga-portugal.pt | +351927567666

 
Publicado na Página IGUALDADE XXI no jornal Diário Insular de 24 de Maio de 2018



terça-feira, 8 de maio de 2018

MUTILAÇÃO TAMBÉM É TRADIÇÃO


Segundo dados da Unicef, no ano de 2016 foram contabilizados em Portugal, 80 casos de Mutilação Genital Feminina (MGF).
Na maioria dos casos, a prática de MGF é feita durante a infância e compreende todos os procedimentos, que levam à remoção de parte ou da totalidade dos órgão genitais externos da mulher, levados a cabo por motivos não médicos.
Existem vários tipos, que infra  se indicam:
Tipo I: remoção parcial ou total do clítoris e/ou do prepúcio, designada por clitoridectomia;
Tipo II: remoção parcial ou total do clítoris e dos pequenos lábios, com ou sem excisão dos grandes lábios;
Tipo III: Estreitamento do orifício vaginal através da criação de uma membrana selante, pelo corte e aposição dos pequenos lábios e/ou dos grandes lábios, com ou sem excisão do clítoris, designada por infibulação;
Tipo IV: Todas as outras intervenções nefastas sobre os órgãos genitais femininos por razões não médicas, por exemplo: punção/picar, perfuração, incisão/corte, escarificação e cauteriação.
Todas estas intervenções têm inúmeras complicações decorrentes e os seus efeitos são extremamente prejudiciais à saúde da mulher e mantêm-se ao longo da vida. Os efeitos a curto prazo, são nomeadamente, dor severa, choque, hemorragias, por vezes mortais, infeção por tétano, infeções generalizadas, retenção urinária, aparecimento de úlceras na zona genital, retenção urinária e febre.
Já os efeitos a longo prazo, consistem em anemia, formação de quistos e abcessos, lesões na uretra devida à incontinência urinária, relações sexuais muito dolorosas, hipersensibilidade da zona genital, formação de cicatrizes profundas, distúrbios ao nível do ciclo menstrual, infecões recorrentes no trato urinário, infertilidade, obstrução por vezes completa da vagina, maior risco de hemorragia em caso de parto.
Parece impossível, mas existem vários países e comunidades, que incentivam e justificam esta violação clara dos direitos das mulheres e das crianças, motivados por uma tradição religiosa enraizada.
A MGF é vista como uma iniciação das meninas e raparigas no mundo adulto, levando à sua integração social. As que não passam por este processo, são muitas vezes discriminadas, gozadas e postas de parte. Neste contexto, os órgãos genitais femininos são encarados como sujos e impróprios.
Sexualmente, a MGF é considerada como um garante de fidelidade. É mais uma forma de controlo da virgindade da mulher, sendo a castidade tida como promotora de um bom casamento.
É geralmente iniciada e executada por mulheres, que a vêem como motivo de honra e receiam, que se não realizarem a intervenção, as filhas e netas ficarão expostas à exclusão social. O procedimento é normalmente realizado por uma circuncisadora tradicional, nas casas das meninas, com ou sem anestesia. O cortador é geralmente uma mulher mais velha, mas em comunidades onde o barbeiro assumiu o papel de assistente de saúde, ele também executará a MGF.
Quando actuam os cortadores tradicionais, podem ser usados ​​dispositivos não esterilizados, incluindo facas, navalhas, tesouras, vidro, e pedras afiadas.
A MGF é praticada em cerca de 28 países de África e em muitos outros no Oriente Médio e na Ásia, bem como várias comunidades de imigrantes na Europa, América do Norte e Austrália.
Infelizmente esta prática, como supra se referiu, também se verifica em Portugal a coberto de comunidades de imigrantes, que não denunciam estas situações, não sendo as mesmas criminalmente punidas. No entanto, a nossa legislação é severa na punição da MGF, sendo considerada um crime autónomo desde 2015, de acordo com o artigo 144ºA, do Código Penal, é punida com pena de prisão de dois a dez anos.
O Dia Internacional da Tolerância Zero contra a Mutilação Genital feminina celebra-se a 6 de Fevereiro.
 
Xénia Leonardo - Jurista
UMAR Açores

Publicado na Página IGUALDADE XXI no jornal Diário Insular de 4 de Maio de 2018