quarta-feira, 22 de junho de 2022

Sobre o Dia Internacional da Mulher: a liberdade e a igualdade encorajadas através da realização de um Workshop de artesanato

 

No âmbito das comemorações do Dia Internacional da Mulher realizou-se, no passado dia 6 de março, na UMAR Açores, Delegação da Ilha Terceira, e em cumprimento de todas as medidas de higiene e etiqueta respiratória em vigor, um Workshop gratuito de Artesanato com Botões.

Uma pessoa mais exigente poderá certamente estranhar a que propósito é que um evento desta natureza pode ser associado à celebração do dia 8 de março. Tanto mais que, segundo os entendidos nesta matéria, a história do artesanato teve início com a própria história do homem, perante a necessidade de criar objetos para seu uso quotidiano e o Dia Internacional da Mulher surge, como bem sabemos, num passado (muito) mais recente, desde o início do século XX, em virtude dos movimentos trabalhistas.

Não se pense, à primeira vista, que o objetivo deste evento teve que ver, tão-só, com a partilha de tendências de moda atuais, através da elaboração de um acessório único como um colar ou uma pulseira e que, ainda hoje, se considera (erradamente) que apenas a algumas pessoas pode interessar.

A ideia do Workshop de artesanato surgiu, antes, com o intuito de demonstrar que, teoricamente, qualquer pessoa pode, de igual modo, criar, livremente, alguma peça de artesanato, proporcionando, dessa forma, o reavivar de alguns dos princípios mais amplos dos Direitos Humanos e que estão subjacentes à celebração do Dia Internacional da Mulher, tais como a liberdade e a igualdade, bem como de todas as reivindicações das mulheres contra tudo o que pode ser tendências para diferenciar o exercício de direitos das mesmas, em relação aos homens, sejam de origem histórica, cultural ou fruto de alguma tradição.

É que, tal como o artesanato, em que o processo de criação, para além de ser livre, existe para qualquer pessoa, sem distinção, também o dia 8 de março simboliza, fundamentalmente, a liberdade pela promoção da igualdade de direitos entre todas as pessoas, sejam elas homens ou mulheres. Nunca é demais relembrar que nos termos dos artigos 1.º e 2.º, respetivamente, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas na resolução 217A (III) de 10 de Dezembro de 1948, “[t]odos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos” e podem "invocar os direitos e as liberdades proclamados [naquela] Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra"(1).

Ora, os direitos das mulheres são, antes de mais, direitos humanos. Sendo que, na sua maioria - e no que se refere, especificamente, a Portugal -, surgem como reflexo da liberdade que se conquistou com o 25 de abril de 1974. Basta pensar que antes da Revolução dos Cravos não se falava, por exemplo, na igualdade de tratamento no casamento e no divórcio, para além de que algumas das carreiras e profissões que ainda existem, atualmente, não eram acessíveis a todas as pessoas.

A igualdade de direitos tem vindo a ser conquistada porque, acima de tudo - e pelo menos no nosso país -, temos liberdade (e responsabilidade) para a conquistar.

O Dia Internacional da Mulher é, pois, um marco histórico, não só pelos direitos adquiridos pelas mulheres, mas também pela liberdade de poder continuar a lutar por mais direitos, com vista à igualdade de género.

É também por isso, pela responsabilidade de promover uma sociedade mais igualitária, que devemos celebrar, sempre, esta data.

Saliente-se que, apesar de todos os avanços nesta matéria, ainda nenhum país alcançou a igualdade plena (2). Isso traduz-se, entre outras situações, nos números elevados de mulheres que ainda são vítimas de violência, nos casos de mulheres e raparigas que foram vítimas de mutilação genital, na difícil conciliação entre a vida familiar e profissional e até, mais recentemente, na representação nos processos decisórios relativos à pandemia. O que é de estranhar sobretudo se atendermos que, de acordo com a informação divulgada, recentemente, pelo Parlamento Europeu, cerca de 76% dos 49 milhões de cuidadores de saúde na União Europeia, que se viram mais expostos ao vírus, são mulheres (3).

No entanto, e tal como alertou a Comissão Europeia, numa declaração que teve em vista o Dia Internacional da Mulher, “85,2 % dos participantes à frente dos grupos de trabalho nacionais dedicados à COVID19 de 87 países, incluindo 17 Estados-Membros da UE, eram homens” (4).

Como salientou o Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas, António Guterres, “embora as mulheres representem 70% dos trabalhadores da área de saúde, são amplamente superadas em número pelos homens na gestão da área de saúde e constituem apenas um em cada dez líderes políticos em todo o mundo, o que nos prejudica a todos”(5). Também a Presidente da Comissão Europeia, Ursula von del Leyen, veio referir, a 8 de março deste ano, que "[a] Comissão exigiu que todos os Estados-membros colocassem as mulheres no centro dos seus planos de recuperação pós-COVID-19. Só será uma verdadeira recuperação se esses planos forem para todos" (6).

Destaca-se, neste âmbito, a "Estratégia para a Igualdade de Género 2020-2025" que tem por base os seguintes objetivos, em matéria de igualdade de género na Europa: "Nem violência nem estereótipos”, “[t]er uma vida próspera numa economia assente na igualdade de género”, “[a]ssumir cargos de direção de forma equitativa em toda a sociedade”, “[i]ntegração da perspetiva de género e promoção de uma perspetiva interseccional nas políticas da EU”, “[f]inanciar medidas para realizar progressos em matéria de igualdade de género na EU” e “[a]bordar a igualdade de género e a capacitação das mulheres em todo o mundo” (7).

Posto isto, pese embora a escassa participação no Workshop realizado a 6 de março (fruto das circunstâncias atuais), fazendo, novamente, uma analogia com o artesanato, sempre se dirá que, tal como em qualquer processo de criação artesanal, em que cada pessoa assiste, no final, à materialização da sua ideia, importa, agora, dar corpo a toda a estratégia de combate à desigualdade de género, não só no Dia Internacional da Mulher, mas em todos os outros dias das nossas vidas.


(1) Cfr. https://unric.org/pt/declaracao-universal-dos-direitos-humanos/

(2) Cfr. https://unric.org/pt/dia-internacional-da-mulher-porque-e-que-ainda-se-celebra-este-dia/

(3) Cfr. https://www.europarl.europa.eu/news/pt/headlines/society/20210225STO98702/compreender-o-impacto-da-covid-19-para-as-mulheres-infografias

(4) Cfr. https://ec.europa.eu/portugal/news/statement-by-the-ec-ahead-of-international-womens-day-2021_pt

(5) Cfr. https://unric.org/pt/covid-19-ameacas-aos-direitos-das-mulheres-prejudicam-nos-a-todos/.

(6) Cfr. https://www.europarl.europa.eu/news/pt/press-room/20210304IPR99215/dia-internacional-da-mulher-celebrado-na-sessao-plenaria.

(7) Cfr. https://eurocid.mne.gov.pt/artigos/mulheres-na-uniao-europeia.

 

Rute Cardoso Ferreira da Silva

Voluntária na UMAR Açores, Delegação da Ilha Terceira







Publicado na Página IGUALDADE XXI no Jornal Diário Insular de 26 de Março de 2021

 

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