Antes de responder a uma pergunta tão complexa quanto
esta e considerando que muitas pessoas (inclusive eu) não são especialistas ou
não estão totalmente familiarizadas com o conceito de feminismo, acho
necessário esclarecer os termos chave desta questão, para que todos partamos da
mesma base, o mais objetiva possível.
O feminismo é um conceito com mais de um século de
história e tanto no passado como agora exige o reconhecimento das mulheres, dos
seus direitos e capacidades tradicionalmente reservados aos homens. Em resumo, trata-se
de um movimento social que exige igualdade entre homens e mulheres.
Agora, se nos perguntarmos o efeito positivo que esse
movimento tem para com o género masculino em particular, podemos perder-nos num
debate complicado em que parte dos homens podem sentir-se ofendidos por várias
razões: sentirem-se excluídos pela própria etimologia da palavra "femin-ismo
"; pensar que estão a ser questionados os seus próprios valores pessoais e
sendo rotulados com base no seu género (assim como as mulheres já reclamam há
algum tempo); sentindo-se não identificados ou até atacados por não se
considerarem nem mulheres nem como pessoas sexistas (aquelas que mostram
preconceitos ou discriminação contra um género).
Por outro lado, ainda encontramos pessoas de todos os
sexos que confundem o termo feminismo (igualdade de género) com femismo
(discriminação de género masculino). Alguns até acham difícil acreditar que
hoje ainda partamos de diferentes bases de direitos e liberdades para com as
mulheres, e que o que se pretende não é desvalorizar o homem, mas dar a elas mais
visibilidade, voz e poder para alcançar uma equidade, ou condições iguais,
começando com o nome do movimento.
Também não nos devemos esquecer de que não podemos
ignorar uma realidade que, ao não nos afetar pessoalmente, não implica que ela
não exista. Negar a existência de sexismo ou da violência de género e a
necessidade de uma ferramenta de luta como o movimento feminista é negar a
discriminação, assédio e sofrimento de uma grande parte da população do mundo,
de ambos os sexos.
Da mesma forma, uma pergunta recorrente também pode ser...
Será que é atingível essa equidade ou é apenas uma utopia ideológica? Afinal,
homens e mulheres são diferentes, mas não é só isso, também há distinções entre
mulheres a respeito de outras mulheres, exactamente o mesmo que acontece com os
homens. Daí a complexidade deste movimento e todas as suas divergências ao
longo da história. Felizmente, o conceito geral de feminismo concentra-se só
nas diferenças de género e sempre com o objetivo de alcançar essa igualdade de
direitos e oportunidades, algo que em princípio todos concordamos.
Os famosos estereótipos e valores que, em certos
contextos culturais, continuam a ser atribuídos a cada género (competitividade,
sensibilidade, empatia, inteligência, liderança...) e que no fundo são o
resultado de uma série de preconceitos e generalizações adquiridas. Será que não
nascemos todos com esses atributos ou com a capacidade de treinar força, sentir
e expressar emoções, ser ambiciosos ou altruístas? Porque é que essa atribuição
de valores é tão limitada e preconceituosa? Cada indivíduo deve ter o direito
de ser quem deseja, sem rótulos ou condicionamento social. A verdade é que cada
pessoa é diferente das outras física e mentalmente. E essa diversidade, às
vezes, é difícil de ver e aceitar para o mesmo indivíduo e para a sociedade, portanto,
o positivo para todos seria vê-la como um facto e como parte das nossas
qualidades e beleza individual. A verdade é que o inimigo comum é precisamente
essa discriminação, ódio e violência contra a nossa diferença em favor do
respeito e da tolerância.
Estabelecidas as bases e os problemas da questão, porque não
agora tentar-se, não sem algum esforço, imaginar-nos na pele de homens e ver o
que a igualdade pode trazer... Na minha opinião subjetiva: Feminismo pode impulsionar
a alguns homens (assim como a muitas mulheres) a livrarem-se dos papéis de género
e oferecer a oportunidade de refletir e partilhar os seus próprios sentimentos,
seja tristeza, alegria, amor, raiva, medos e paixões; Não serem julgados pelos
seus interesses ou profissão, ter as mesmas condições que os seus parceiros para
desfrutar da paternidade, partilhar responsabilidades financeiras no lar, tirar
valor às exigências dos estereótipos superficiais (incluindo relações íntimas)
e, é claro, obter o entendimento desejado e vínculo com as suas parceiras, namoradas,
amigas, filhas, irmãs, mães ou qualquer pessoa do sexo oposto. Concluindo, as
vantagens de viver numa sociedade mais justa para todos, onde a pessoa é vista,
não pelo género mas com a mesma oportunidade de ser ouvida independentemente da
origem. Esta sociedade estará necessariamente mais sensibilizada para os
problemas sociais e tolerante às diferenças. Menos egoísta e mais altruísta,
mais humana e menos “animalesca”.
Infelizmente,
acredito que todos somos capazes de reconhecer que hoje essa sociedade está
longe de ser uma realidade. Em vez de desconfiar do desconhecido, e de
conceitos como o feminismo ou discriminação positiva, seria bom iniciar a
mudança e ser um pouco mais auto-críticos. Apenas tentem imaginar os benefícios
que essa luta contra a discriminação e os preconceitos sistémicos podem trazer
para todos. Podemos começar individualmente, destruindo os rótulos aprendidos para
cada género e, como um homem já me disse “abrirão o vazio que ambos os géneros
vão preencher junto do outro”.
Clara Polaino
Publicado na Página IGUALDADE XXI no Jornal Diário
Insular de 24 de Outubro de 2019