segunda-feira, 21 de outubro de 2019

IDENTIDADE DE GÉNERO: O QUE É?

 
 
A 16 de agosto foi publicado em Diário da República o Despacho n.º7247/2019 que estabelece medidas administrativas para a não-discriminação de jovens e crianças transexuais e intersexo, seguindo a aprovação da Lei n.º38/2018, de 7 de agosto de 2018, que visa estabelecer o “direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção de características sexuais de cada pessoa”.

Esta lei tem como principal objetivo proteger um conjunto de crianças e jovens, que apesar de serem uma minoria, existem e devem ver os seus direitos salvaguardados.
As especulações em redor deste decreto têm sido imensas e, por essa razão, para melhor melhor compreensão do mesmo é importante conhecermos a diferença entre identidade, género e identidade de género.

O significado de identidade:
Para diversos estudiosos de ciências sociais e humanas a identidade é o que permite reconhecer o indivíduo enquanto ser único.
A nossa identidade é o reflexo de um conjunto de carateres que só podem ser associados a nós mesmos, como por exemplo: o nosso nome
, data de nascimento, a nossa filiação, impressões digitais… Enfim, inúmeras características que são apenas nossas.
Embora possamos nos identificar, em diversos contextos e sentidos, com outras pessoas e até mesmo existirem, por vezes, algumas semelhantes connosco, ninguém é igual ao outro.
A nossa identidade é resultado da cultura e socialização, à qual podemos chamar identidade cultural e social. Culturalmente partilhamos uma identidade com o povo português, embora socialmente estejamos em grupos díspares, devido à faixa etária em que nos inserimos, classe social, género, história de vida…
Todos estes fatores criam aquilo que nós somos. Criam a nossa identidade e como tal somos seres únicos e individuais.

O género:
A necessidade de definir género surgiu quando, socialmente, percebeu-se que a identificação e os papéis atribuídos ao masculino e ao feminino não poderiam ser uniformes e/ou preditos a partir dos indicadores biológicos básicos.
Era necessário existir uma diferenciação tendo em conta os papéis assumidos socialmente por homens e mulheres, rapazes e raparigas.
Segundo Françoise Héritier (1996) o género constrói-se na relação entre homem e mulher, uma vez que nós não somos indivíduos isolados e toda a existência humana deve-se à socialização. Assim, foi sempre necessário atribuir “funções” e separar o que era masculino do que era feminino para “dar sentido” à diferença entre ambos.
Neste sentido Héritier (1996) definiu género como a palavra que “determina tudo o que é social, cultural e historicamente definido”.
Esta definição
, faz-nos sentido décadas depois porque se assim não fosse não haveria, ainda, tanta categorização do que é indicado para o homem e do que é indicado para a mulher.

Então o que é a Identidade de Género?
Antes de mais deve ser diferenciada a identidade de género da ideologia de género.
A primeira consiste no modo como os indivíduos se identificam na sociedade com base nos papéis sociais de género e no sentido individual da sua identidade. A segunda trata-se de um conceito que está intrinsecamente relacionado com os papéis atribuídos a cada género como produto da evolução cultural e histórica, que ao longo do tempo foi pautando o que era correto homens e mulheres fazerem e /ou assumirem.
Posto isto, a identidade de género não está relacionada com fatores biológicos, culturais e sociais. É sim, a forma como determinada pessoa se identifica no seu todo (masculino, feminino ou ambos).
Será também, incorreto relacionar a identidade de género com a orientação sexual pois esta indica por qual género (masculino, feminino ou ambos) determinada pessoa se sente atraída, física, romântica e/ou emocionalmente.
Portanto, poderão existir sujeitos com uma identidade de género diferente do seu sexo biológico e serem heterossexuais, homossexuais ou bissexuais.

É neste sentido que o despacho aprovado no mês de agosto vem assegurar a “adoção de medidas no sistema educativo”, pois é neste meio que muitas crianças e jovens iniciam o processo de alteração de identidade de género.
Espera-se também que o meio educativo seja o mais inclusivo para as camadas jovens da nossa sociedade, porque pilares socioeducativos e de definição de personalidade são estruturados neste ambiente, devendo combater a discriminação e assegurar a formação de indivíduos socialmente conscientes.

O esperado é o respeito pela identidade, privacidade e bem-estar das crianças e jovens que estão em processo de alteração de identidade de género, permitindo que 1) utilizem o nome pelo qual se identificam, em todas as atividades escolares e extraescolares; 2) respeitem os vestuários que escolhem de acordo com a sua identidade; 3) caso desejem, recorram às casas de banho e balneários, de acordo com a sua singularidade e privacidade; 4) formem pessoal docente e não docente para que ultrapassem a imposição de estereótipos e comportamentos discriminatórios.

Não devemos esquecer que estas crianças e jovens são dos indivíduos mais vulneráveis nos ambientes escolares, suscetíveis ao bullying, maus tratos por parte dos pares e não só, por desconhecimento e ignorância, como por preconceito.

Devemos tentar garantir sempre, a qualquer criança ou jovem, condições de igualdade em qualquer contexto/meio a que pertença e isso só é alcançável através do pleno respeito pela identidade e individualidade de cada pessoa!
 

 
Raquel Costa
Psicóloga
UMAR Açores - Delegação da ilha Terceira
 

Publicado na Página IGUALDADE XXI no Jornal Diário Insular de 19 de Setembro de 2019



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