“Violência nas relações de intimidade: o que importa saber…” foi o título dado a uma tertúlia / live através da rede social Facebook que a UMAR Açores levou a cabo no passado dia 10 de Dezembro de 2020 – Dia Internacional dos Direitos Humanos – como forma de “encerrar” a campanha deste ano relativa aos 16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência Contra as Mulheres. O evento foi dinamizado pelas três psicólogas da Associação: Raquel Félix Fontes - UMAR São Miguel; Carla Mourão - UMAR Faial e Raquel Costa - UMAR Terceira.
Inicialmente estava pensado fazer-se uma organização por temas mas o discurso, felizmente, saiu de tal modo natural que muitos pontos foram tocados e que são preocupações comuns partilhadas não só pelas técnicas como por muitos dos participantes que assistiram e intervieram no momento.
Iniciou-se o
discurso abordando a perspetiva feminista sobre o fenómeno da violência na
intimidade que amplifica a dinâmica de desequilíbrio e poder dentro da relação
abusiva, assim, como as narrativas socioculturais em torno das mulheres. O
ciclo da violência também foi assunto, neste espaço, recordando a complexidade
da relação abusiva. Foi realçada a importância de conhecer os sinais para que
se possa intervir o mais atempadamente possível, evitando, assim, problemas de
saúde maiores.
Também foi possível refletir sobre os avanços que se denotam na região no que concerne ao tema da Violência Doméstica e no Namoro e como se pode/deve melhorar as formas de intervir e de prevenir esta problemática.
Foi de comum acordo que nos últimos anos tem deixado de ser um tópico tabú (ainda o é mas não tanto como à uma década atrás), porém ainda não são tomadas formas de afirmação por parte de vítimas, testemunhas e até autoridades em diversas situações e contextos. É verdade que o nosso contexto sócio-cultural tem as suas particularidades e o facto de estarmos isolados na nossa insularidade permite que muitas situações se conheçam e se tornem incomodativas em diversos aspetos. Ainda assim, todo/as concordaremos que o facto de serem as vítimas a saírem do seu espaço pessoal trata-se de uma nova (entre muitas outras) formas de revitimizar a pessoa.
Ao longo da conversa foi possível ainda perceber que a prevenção e formação deveriam ser focos constantes e que o seu início precoce apenas viria a beneficiar a população em geral, e educar para a igualdade, no sentido de precocemente estes valores estarem solidificados, permitindo na adultez a robustez da igualdade, e de uma sociedade sem discriminações tão visíveis e expostas, mesmo fraturantes.
A “normalização” que se faz constantemente da violência é que é anormal, e mais curioso é que são os próprios jovens que a legitimam nos seus comportamentos dentro das relações de namoro.
De igual modo, foi possível perceber as vulnerabilidades do próprio sistema de intervenção face a vítimas de idade avançada e de realidades que ainda não foram “pensadas” na região (como o caso de pessoas LGBTI). As respostas são condicionadas pela nossa realidade e pela inexistência de facilidade de articulação entre diferentes meios de intervenção.
A nível judicial é pertinente “proteger” a vítima do seu próprio consentimento nas situações de suspensão provisória do processo, pois estamos a expô-la novamente, e a revitalizá-la, não a protegê-la, diria até que a estamos a por em risco. Também nesta área é fundamental o cruzamento dos processos de violência doméstica com os de família e menores. Dá que pensar se quem agrediu, muitas vezes em frente dos próprios filhos, consegue ser na verdade um bom pai ou uma boa mãe… Temos o dever de não só proteger a vítima, como proteger a criança e perceber e avaliar o impacto da violência doméstica nos menores.
A violência é um problema social e, como tal é necessário o entrosamento de toda/os nós para a vivência de comunidades mais saudáveis, que abraçam a diversidade humana e não são cúmplices com maus-tratos.
Aproveitamos para recordar que a Violência Doméstica é um crime público, o que significa que todo/as nós podemos denunciar esta situação. Para tal deverá contactar a Polícia de Segurança Pública, por telefone ou presencialmente, e relatar o sucedido (tem o direito ao anonimato!).
Resumidamente, estamos melhores do que estávamos mas podemos ficar muito melhor do que estamos. Para isso é necessária a intervenção, ajuda, consciencialização e atuação de todos. Porque uma boa sociedade constroí-se com bons cidadãos...
As psicólogas da UMAR Açores
Raquel Félix Fontes
Carla Mourão
Raquel Costa
Publicado na Página IGUALDADE XXI no Jornal Diário Insular de 23 de Dezembro de 2020