quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Destaque do mês de Agosto de 2010

PROFESSORA TERESA VALADÃO

Licenciada em História e Filosofia via ensino, com Formação em Desenvolvimento Pessoal e Social e Mestrado em Estudos sobre as Mulheres e coordenadora do Clube de Teatro Orpheu, a Professora Maria Teresa Valadão Caldeira Martins, de 44 anos de idade, em parceria com a UMAR – Açores e com a Associação Cultural Burra de Milho foi convidada, pela professora Tânia Fonseca, a desenvolver uma peça de teatro, subordinada ao tema da violência doméstica, no namoro e nas escolas. Intitulada “Medo de Mim… Pavor dos Outros”, foi dramatizada em algumas freguesias da Ilha Terceira e revelou ser um sucesso.
A peça procurou sensibilizar o público para um problema social grave, em que cada pessoa tem o direito e o dever de ter uma atitude de prevenção e denúncia. Segundo a autora da peça, cada vez mais as pessoas têm desenvolvido uma maior consciência sobre a questão da violência.
Olhando para trás, aceitar este convite foi para a Professora Maria Teresa como um “desafio, muito diferente do que tínhamos feito até então”. Foi o “embarcar numa aventura que revelou ser muito agradável”. Para além de que o trabalho em parceria “foi outro desafio”.
Define este trabalho como algo “bastante complexo”, pois “trabalhar o tema da violência é algo extremamente vasto”. Apresentar um trabalho deste género ao público em geral, requereu alguns cuidados nomeadamente, no que respeita à linguagem, à apresentação das personagens e à mensagem que se pretendia passar às pessoas. “A linguagem teve de ser bastante acessível, e a peça necessitou de um fio condutor em que cada personagem tinha que embarcar uma personagem típica, um padrão típico, um perfil típico, tanto de vítima como de agressor, porque interessava fazer as duas perspectivas”. “Nós queríamos que as pessoas vissem e sentissem e acima de tudo, que reflectissem sobre todo o ciclo de violência”. “Queríamos que fosse transmitida uma grande mensagem”. “Foi muito complicado pôr tanto sentimento em cena”, mas foi um “desafio incrível” e “os alunos fizeram um trabalho extraordinário”.
Pode-se dizer que esta peça foi realmente capaz de captar a atenção dos espectadores e levar à reflexão. Segundo a Professora, no final de cada peça, era abordada por espectadores que lhe diziam terem-se identificado com algumas das personagens. Outras confessaram-lhe “eu estava a sentir e a viver cada momento daquela peça como se fosse a minha própria vida”. Recebeu um feedback muito positivo, que foi de encontro ao objectivo da peça. Sentiu que este trabalho “não tinha sido em vão”, pois “com situações destas tem de se ser muito concreto e muito fiel àquilo que se transmite”.
Relativamente a estas problemáticas da violência, esta pensa que quando se trata de denunciar estes casos “torna-se complicado, porque ainda há muito medo”, Segundo a Professora, muitas vezes estas situações ocorrem junto de casais que já convivem há muitos anos. No entanto, acha que neste momento “as pessoas estão a ficar mais despertas”. Para tal também tem contribuído o trabalho e a ajuda das várias associações e dos meios de comunicação social. O aumento das denúncias é, “por um lado lamentável, porque significa que o número é considerável, mas por outro lado significa que a pessoa começa a ganhar mais coragem para transmitir o que se passou”. Do ponto de vista da entrevistada, é notório nas vítimas de violência uma maior capacidade para se afirmarem, revelando-se menos “alheias às situações” que vivenciam.
Tratando-se a nossa Associação, de uma associação feminista, tivemos curiosidade em saber um pouco sobre o seu Mestrado em Estudos sobre as Mulheres. Justificou a sua escolha explicando que achou “extremamente inovador quando vi o perfil das disciplinas” e “tinha um corpo fabuloso de docentes”. Durante dois anos a professora Teresa, deslocou-se todas as semanas a Lisboa para fazer o seu mestrado, pois metade da semana dava aulas na Terceira. Foi um enorme esforço, mas confessa que valeu a pena todo o seu sacrifício, pois “foi um grande desafio que eu gostei”, “trabalhámos de tudo, desde a época pré-clássica, até mesmo à actual, abordando os vários tipos de violência (…) as várias formas de pensamento sobre a mulher, as conquistas, a evolução, o que se foi ou não fazendo, foi muito interessante”.
Devido à sua formação e conhecimento relativamente a toda a evolução da mulher até aos dias de hoje, bem como a sua experiência, observa que actualmente existe “mais algum posicionamento” da mulher na sociedade, mas ainda “numa luta muito grande”. “Vemos que a nível do mercado de trabalho (…) a mulher, indiscutivelmente, ganhou muito, surgiram novas profissões que começa a exercer, mas é uma luta contínua e constante que tem ainda uma grande batalha pela frente”.
Em relação à sociedade em geral, considera que esta encara a mulher de uma forma “expectante sobre o que é que irá fazer, sobre o que é que é capaz de fazer e como é que irá fazer”. No entanto, “quando vêem, as provas de que é capaz, a sociedade aí é impecável”.
Esta pensa, que não é por medidas radicais nem extremistas que se consegue alcançar os direitos, como aconteceu em muitos movimentos feministas ao longo dos séculos. “Acho que é pela qualidade do que se faz, essencialmente pelo papel de intervenção correcto, eficaz e dinâmico que se chega a alguma coisa”. Defende outras formas de conquista de direitos que passam pelo “diálogo, a palavra e a intervenção através de projectos concretos, eficazes e com qualidade ”.
A atitude das mulheres perante uma situação de discriminação revela ainda, na sua opinião, dificuldade em defenderem e lutarem pelos seus direitos. “Às vezes é difícil tomar a iniciativa”, mas “hoje em dia temos os programas EQUAL que já começam a lutar por essas questões de igualdade de expressividade da mulher”.
A mudança de mentalidades é um processo demoroso, principalmente no que respeita a questões relacionadas com a emancipação do sexo feminino. De acordo com a nossa entrevistada, “nós sabemos que a economia sofre transformações mais rápidas, mas as mentalidades demoram muitos anos, ou séculos a transformarem-se”.
Finalizou-se esta interessante conversa questionando a nossa entrevistada sobre a mensagem que gostaria de deixar aos nossos leitores/as sobre a questão da violência. Para esta é necessário “começar primeiro por perceber bem a sociedade e analisar as suas problemáticas. Olhar para as situações e perceber quem as vive, pois são condições extremamente graves e aflitivas, das quais se torna muito difícil, para as próprias pessoas, de saírem. São pessoas que necessitam de facto de uma grande ajuda, de uma grande compreensão e que lhes seja restituída a sua dignidade". Por fim, elogia o trabalho que é feito por todas as associações que, na sua opinião, actuam de uma forma “extremamente activa e dinâmica”.

Carla Garcia


Publicado na página Igualdade XXI do Jornal Diário Insular de 1 de Setembro de 2010

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