Maria Ondina Correia Machado Sousa, natural da freguesia de S. Bartolomeu, tinha 13 anos aquando do seu primeiro trabalho remunerado, tomava conta de uma criança como forma de poder contribuir para os rendimentos do agregado familiar. Após esta primeira experiência de cariz profissional muitas outras se seguiram. Trabalhou como: cozinheira, operária de uma fábrica de produção em série, cuidadora de idosos dependentes, vendedora ambulante de “comes e bebes”, entre outros tantos ofícios.
Mas foi em 2008, que Maria Ondina, com os seus 50 e poucos anos de vida, decidiu trabalhar, durante 1 ano, ao abrigo do Programa Prosa, nos Serviços Municipalizados de Angra do Heroísmo, na recolha de resíduos sólidos urbanos. Confessa que, quando lhe propuseram “varrer as ruas” do município pensou: “devem estar a brincar, isso não pode ser, (…) é um trabalho de homem!” De pronto esta primeira ideia desvaneceu-se e, Maria Ondina, decidiu abraçar este desafio, alegando ser uma “amante da liberdade”. De acordo com as suas palavras: “quando trabalho gosto de fazer bem o meu serviço”, e foi com este espírito empreendedor que iniciou a labuta. Durante a primeira semana teve orientação para a realização das funções que estavam ao seu encargo. Posteriormente, a partir da segunda semana, todos os dias às 8h00, Maria Ondina reunia-se, no Edifício dos Corte-Reais, com os restantes 8 colegas para recolherem os materiais necessários à actividade e, assim, começarem o dia de trabalho. Sendo a única mulher desta equipa, refere, esboçando um pequeno sorriso, que quiçá, os seus colegas pensassem: “o que faz uma mulher aqui?”, visto que esta profissão, como ela mesma referiu anteriormente, é desempenhada maioritariamente por homens. Mas o que é facto é que sempre a trataram com muito respeito. Contudo, comenta que não houve espaço para criar vínculos relacionais uma vez que “não havia tempo para conversar, o trabalho tinha que ser feito”.
Defende que é importante: “um/a trabalhador/a saber controlar o seu serviço”. Conta que demorou cerca de 1 mês a descobrir a melhor estratégia para que pudesse desempenhar o seu trabalho com a máxima eficiência, ou seja, que a sua zona ficasse “toda limpa e em ordem”, destacando que “fazia o possível e o impossível para isso”.
Apreciava o facto de ser a responsável pela execução do seu serviço, desfrutando de liberdade para se organizar como assim entendesse. Explica que se dedicava à limpeza das ruas como se fosse a sua casa, argumentando que “afinal de contas os empregadores contratam-nos para fazermos bem o serviço. É com isso que estão a contar”.
Relativamente às dificuldades do ofício observa que, por vezes, as estações da chuva e do frio impedem a recolha, assim como há dias em que os depósitos do lixo estão mais pesados.
Recorda um transeunte que certa vez lhe disse: “Oh mulher, vai para casa que isso não é serviço para mulheres” e que noutra ocasião foi uma senhora que se pronunciou, dizendo: “ Oh mulher, isto é muito pesado para si”. Mas para a entrevistada pouca lhe interessavam estes ou outros comentários, o que realmente lhe interessava era cumprir o seu dever, que as ruas ficassem limpas!
Considera que as cidadãs e os cidadãos têm o bom senso de colocar os detritos nos sítios apropriados, mas muitas vezes, devido ao mau tempo, ou aos animais domésticos ou outros, as ruas estão bastante sujas, tornando-se “necessário andar em cima do serviço, para que o lixo não se acumule”.
Maria Ondina valoriza o trabalho por duas razões: pela independência económica, permitindo-lhe tomar as suas próprias decisões acerca da gestão dos rendimentos, e pelo bem-estar psicológico resultante da ocupação com uma actividade prazenteira.
Acredita que: “toda a gente tem o direito a trabalhar em conformidade com sua escolaridade”, sendo que para quem tem pouca escolaridade, como ela, 4ª classe, as oportunidades são escassas. Contudo ressalva que a vontade para o trabalho é um factor chave para o bom desempenho, e motivação para o trabalho é o que não falta a esta entrevistada!
Raquel Félix
Publicado no Jornal Diário Insular - IGUALDADE XXI - de 27 de Fevereiro de 2010
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